Avalon e as Deusas Celtas

Nó Celta

Nos contos e na visão sobre os mitos celtas, podemos observar a força das Deusas nas suas múltiplas facetas ressaltadas na imagem de rainhas, sacerdotisas, druidesas, guerreiras, tecelãs… Mulheres que, normalmente, desempenhavam um papel importante nas sociedades célticas, como soberanas da terra e da guerra, responsáveis tanto na criação como na transformação dos fatos. Elas atuavam como protetoras da tribo, mantenedoras do caminho sagrado e guardiãs dos mistérios do Outro Mundo, onde os Deuses, Ancestrais e Espíritos afins habitam.

Conforme as nossas práticas durante as jornadas meditativas, escolhemos Nove Deusas as quais referenciamos à Avalon e ao Outro Mundo, que são as Deusas irlandesas: Brighid, Boann, Danu e Morrighan. E as Deusas galesas: Arianrhod, Blodeuwedd, Branwen, Cerridwen e Rhiannon.

Brighid – Deusa amada por todos

“Ô Brighid do manto sagrado, rodeai-nos,
Senhora dos cordeiros, protegei-nos,
Defensora da lareira, iluminai-nos,
Ao restituir-nos a memória.”

A Senhora da inspiração poética (Imbas em irlandês – a iluminação divina), da cura e da sabedoria. Brighid é a Deusa da forja, da arte e da poesia, além de ter uma forte ligação com os bardos, guerreiros e curandeiros. Ela é a Deusa do fogo sagrado, a centelha da vida, que até nos dias de hoje conserva-se o costume do fogo perpétuo, mantido aceso em sua homenagem em Kildare, na província de Leinster, leste da Irlanda.

De acordo a tradição gaélica, ao recitar a sua linhagem através da Litania de Brighid, estaremos protegidos: “Brighid, filha de Dagda, filho de Dugal o Marrom, Filho de Aodh, Filho de Art, FIlho de Conn, Filho de Chiara, filho de Cairbre, filho de Cas, Filho de Cormac, Filho de Cartach, Filho de Conn”. Ela é associada ao festival de Imbolc e as águas dos poços curativos, além de ser a guardiã das fontes sagradas.

Boann – Deusa das águas

“Vaca Branca
Rio da sabedoria
Mãe do amor
Lua Branca
Mãe das águas
Que fluem com alegria.”

É a Deusa que deu nome ao rio Boyne, que corre ao lado do monumento pré-céltico de Brú na Bóinne em Newgrange, na Irlanda. A etimologia descrita nas “Dindshenchas”, mitos relacionados à origem dos nomes dos locais sagrados e o ciclo feniano, no “Salmão da Sabedoria” e o Poço de Segais.

Ela é esposa de Elcmar ou Nechtan. Também é mãe de Angus Mac Og com o grande Dagda. O nome de Boann é derivado de “Bo Finn” ou “Vaca Branca”. Boann é considerada a mãe dos rios, que nos traz inspiração para a composição poética e a muitas outras formas de expressão artística. Cantar o nome de Boann enquanto se está sentado ao lado de um rio pode ser uma experiência muito poderosa.

Danu – Deusa Mãe da Irlanda

“A tribo de Anu retrata o grande clã dos deuses da magia e das batalhas.”

Na Irlanda, ela foi associada a dois morros de cume arredondados, chamados de “Dá Chich Anann” ou “Seios de Ana”. Considerada a Deusa da fertilidade, da terra e da abundância. Alguns estudiosos acreditam que Danu e Anann sejam a mesma divindade, outros questionam a sua existência como sendo apenas uma reconstrução nominativa ou um erro de tradução. Supostamente, Danu é a Deusa-Mãe do clã irlandês, as Tuatha Dé Danann, tribo dos Deuses das muitas habilidades. Adorada como a Mãe Terra, pode ter sido originalmente uma Deusa primordial, assim como a Deusa galesa Dôn.

Os membros da tribo, após a invasão dos Milesianos, foram para outra dimensão e passaram a ser conhecidas como “Daoine Sídhe” que, literalmente, significa “Povo dos Montes”. Habitantes do Síde ou as colinas sagradas, os povos do Outro Mundo ou da Ilha da Eterna Juventude (Tir na nÓg), conhecidos também como “Os que vivem para sempre”, pois guardavam consigo o segredo da imortalidade.

Morrighan – A Grande Rainha

“Morrigu, a filha de Ernmas, prosseguiu para anunciar a batalha e a grande vitória.”

Morrighan, em gaélico irlandês é Mhór Ríoghain, a rainha dos campos de batalha. Senhora da guerra, possuía uma forma mutável e o poder mágico de predizer o futuro. Ela se envolve com CuChulainn, no ciclo de Ulster, em “O Rapto das Vacas de Regamain“. Cuchulainn encontra Morrighan com uma novilha em seu território, não reconhece a Deusa e dirige-lhe vários insultos. Depois disto, ela prediz o seu fim: “Eu vigio a sua morte.”

Nos mitos aparece como umas das filhas de Ernmas, as “Morrígna” (Badb, Macha e Nemain; podendo ser Badb, Macha e Morrígan ou Anand). Mencionada como a Rainha Fantasma com corvos sobrevoando os campos de batalha, que instigava medo e coragem nos guerreiros. Morrighan é uma deidade tutelar e protetora, associada à fertilidade, à soberania e às fadas. Como metamorfa (shapeshifter), podia se transformar em enguia, lobo e uma novilha branca de orelhas vermelhas, descrita na Batalha de Magh Tuireadh. E a referência moderna à personagem Morgana, das lendas arthurianas.

Arianrhod – A Roda de Prata

“Arianrhod de aspecto louvável, a madrugada da serenidade.”

Arianrhod é a virgem que deu à luz aos gêmeos Lleu (representa a luz brilhante) e Dylan (a escuridão do mar profundo), depois de passar num teste de magia feito por seu tio, Math – descrito no quarto ramo do Mabinogion. Filha de Dôn e Belenos, irmã de Gwydion e Gilfaethwy. Senhora do renascimento no Outro Mundo, foi associada à constelação Corona Borealis. Além da possibilidade de reencarnação neste mundo. A tradução mais comum do seu nome é a “Roda de Prata” e sua morada nas estrelas é conhecida como a espiral da vida, a Via Láctea.

A grafia mais antiga do seu nome é Aranrot (que significa monte circular) e os seus atributos são: a fertilidade, a justiça e as iniciações. Arianrhod é a representação soberana da mulher casta que dá à luz, mas que não pertence a nenhum homem. O seu reino é num castelo estelar conhecido como Caer Arianrhod, considerada a guardiã da torre de prata, o fluir entre os mundos. A Senhora do portal ao Caer Siddi.

Blodeuwedd – Deusa do Amanhecer

“Nove poderes de nove flores,
Nove poderes em mim combinados,
Nove botões de plantas e árvores;
Longos e brancos são os meus dedos,
Como a nona onda do mar.”

Blodeuwedd é reverenciada como a Deusa dos novos começos e da capacidade de renovação. A sua história pode ser encontrada no Mabinogion em Math, filho de Mathonwy, que diz que ela foi feita a partir de nove tipos de flores silvestres, por Math e Gwydion, para ser a esposa de Lleu (filho de Arianrhod). Mais adiante, foi transformada em coruja como punição pela traição ao marido, mas que acaba sendo uma bênção de libertação.

Existe muito mais nessa história do que os olhos comuns podem ver… O nome Blodeuwedd, literalmente, significa “Rosto de Flor” e representa, muitas vezes, o um lírio branco. É a esperança que nasce no meio da dificuldade. Ela é a Deusa de um novo amanhecer e da primavera nos mitos galeses. Associada à visão noturna das corujas, às fadas escuras e aos mistérios do Outro Mundo.

Branwen – A filha de Llyr

“Ela é o brilho radiante das estrelas, a mulher mais bela do mundo!”

A Deusa Branwen é a personificação e a representação da soberania e da esperança. Há um capítulo inteiro do Mabinogion que carrega o seu nome: Branwen, a filha de Llyr. É irmã de Bendigedfran, Manawyddan, Efniessin, NiessinBran e Bran, o Corvo Branco, o Abençoado. Tornou-se Rainha na Irlanda e, posteriormente, foi maltratada por seu marido, por causa de uma afronta aos cavalos irlandeses, durante a festa do seu casamento.

Depois de um ano Branwen dá à luz ao bebê Gwern, mesmo assim foi obrigada a trabalhar como copeira numa cozinha-prisão. Ela treinou um estorninho (ave típica da Europa) para levar mensagens ao País de Gales, descrevendo a sua situação e pedindo ajuda ao irmão. Bran liderou uma expedição para resgatá-la, mas foi ferido mortalmente e Branwen morre de tristeza ao saber do fato. Branwen é a Deusa galesa do amor, da profecia e da justiça.

Cerridwen – A Senhora do Caldeirão

“Obtive a Inspiração e a Sabedoria das três gotas do caldeirão de Cerridwen.”

Nos contos de “Hanes Taliesin”, Cerridwen é reverenciada como a Senhora do Caldeirão, Ogyrwen e as sementes da poesia. É a Deusa galesa da transformação, associada à magia, fertilidade e musa da inspiração, a Awen sagrada. O caldeirão é uma analogia ao Graal, que pode sanar todos os males, reviver os mortos e curar os enfermos. Cerridwen é considerada a detentora dos mistérios da vida, da morte e do renascimento.

O bardo Taliesin amigo de Myrddin, que deu origem ao lendário mago Merlin da corte do rei Arthur, foi descrito no mito como Gwyon Bach. Ele nasceu de Cerridwen e se tornou o mais sábio druida, após tomar três gotas da poção que Cerridwen preparava para o seu filho, no Caldeirão da Inspiração.

Rhiannon – Protetora dos Cavalos

“E os pássaros de Rhiannon,
Cantavam para lá no Outro Mundo,
Trazendo-lhe muitas alegrias.”

Rhiannon é representada pela égua branca, a rainha galesa do Outro Mundo, a terra do eterno verão, cujos pássaros poderiam confortar as almas sofredoras. É a Deusa dos encantamentos e da fertilidade, equivalente à Macha irlandesa e Epona gaulesa. Rhiannon teve seu filho roubado logo que ele nasceu e foi acusada, injustamente, pela suposta morte – descrito nos contos do Mabinogion em Pwyll, o Príncipe de Dyfed.

É a poderosa presença que evoca a perseverança ao aguardar a revelação da verdade com o retorno do filho, findando assim o seu martírio e restaurando a sua honra. Rigantona, a Grande Rainha, é homenageada no Solstício de Inverno. A soberana que transmite o seu poder através do regaste da força feminina, inspirando-nos ao autoconhecimento, à sabedoria, à justiça e à paciência. Que assim seja!

Notas:
1. Sobre as divindades galesas: Quatro Ramos do Mabinogi – tradução Bellouesus, 2020.
2. Sobre as divindades irlandesas: Tuatha Dé Danann – enciclopédia por Mary Jones, 2004.
3. Sobre as suposições a respeito de Danu: Is Danu a real goddess? – Sheena McGrath, 2017.
4. Danu e Anu são a mesma deusa? Why I don’t think Danu is Anu – por Morgan Daimler, 2016.
5. Sobre as antigas sociedades celtas: Poder, classe e gênero – por Francine Nicholson, 2003.
6. Sobre a imortalidade da alma: Os Caminhos da Alma – por Wallace William de Sousa, 2017.

Referência bibliográfica:
BELLINGHAM, David – Introdução à Mitologia Céltica – Lisboa: Ed. Estampa, 1999.
GUEST, Lady Charlotte – The Mabinogion – Ed. Kinkley, 1887.
MACCULLOCH, J.A. – A Religião dos Antigos Celtas – Edinburgh: T. & T. CLARK, 1911.
MONAGHAN, Patricia – The Encyclopedia of Celtic Mythology and Folklore – Facts On File: New York, 2004.
SQUIRE, Charles – Mitos e Lendas Celtas – Ed. Nova Era, 2003.

Rowena A. Senėwėen ®
Todos os direitos reservados.
(Texto atualizado em 29/09/2020)

Um breve comentário…

As Deusas não são apenas mulheres lindas e misteriosas, são fortes referências dos mitos da sociedade celta, personificadas através dos seus correlatos, muito além das ilusões romanceadas. Mesmo em suas diferentes faces, elas representam à energia criadora e possuem funções específicas, tais como: soberania, guerra (bravura) e proteção, além dos seus próprios atributos individuais. Havendo muita similaridade entre as tradições e os seus contos.

“A crença religiosa celta e a realeza sagrada que, consistia na deusa da terra transmitir sua energia ao rei, são baseadas na noção de mulheres como fontes de energia criativa e prospera da tribo.” – Por Francine Nicholson.

Essa é a mensagem mítica de Avalon, as Deusas celtas e os mistérios advindos do Outro Mundo. E quando a dedicação é sincera e a busca constante, os caminhos se abrem e a verdade nos é revelada. O estudo sempre nos traz conhecimento, inspiração e sabedoria. Caminhe em equilíbrio e siga a sua intuição.

Bênçãos plenas do Céu, da Terra e do Mar!

Rowena A. Senėwėen ®
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